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maria do rocio vaz cabeca

Madrugada chorada

madrugada[1]

Ainda é noite. A casa acende suas luzes. Lá fora, chão chorado de chuva. Madrugadas têm seu charme, mas nem todas. O inverno despontou há dias e o frio, áspero, não resseca somente a pele…

Duas moças beliscam frutas, com pequeno apetite. Quase prontas, malas em espera. Abraço apertado, beijo no rosto quente de sono. “Eu te amo.” “Eu te amo”, outra vez.

Os dois corações agasalhados afastam-se lentamente de mim. Vejo os cabelos encaracolados, decididos, desaparecerem de vista. E os acastanhados, exibindo lisura, seguirem para outro lado. Não, elas não andam mais de mãos dadas, nem de roupas iguais. Não parecem irmãs. Em voos distintos, despedem-se rumo ao outro hemisfério, onde há verão.

Eu e a solidão ficaremos em boa companhia. Peço por graças sobre as graças, como uma boa Maria. O dia já aponta seus raios de meias esperanças. Nada tão novo debaixo dos céus.

Aceno. Faço de conta que elas estão me vendo. “Estou aqui, se precisar!” “Não fale com estranhos!” Opa, essa nem vale mais: o mundo nunca foi tão estranho…

Espera, preciso de um tempo: quaisquer argumentos de consolo, que minha mente tente elaborar, nesse momento serão em vão. Me deixem em paz.

Mãe é assim mesmo: dá à luz, dá o colo, vira onça, vira a noite, mas na hora de dizer adeus não consegue segurar o coração tomado de dois enormes vazios.

(Foto: Bruna Vaz)

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