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ERNANI BUCHMANN CABECA hojesc

Em busca de Nireu Teixeira

Saí pela Rua das Flores atrás de Nireu Teixeira. Sim, Nireu já partiu há anos, mas me agarrei à esperança de encontrar algum vestígio da sua passagem por ali.

No primeiro quarteirão já não encontro o Grande Hotel Moderno, com seu bar inglês, frequentado por advogados, empresários e jornalistas. Ali hospedou-se Santos Dumont, quando de sua passagem por Curitiba em 1916. Agora é uma loja com locutor na porta, a berrar para fazer de transeunte, cliente. O bar e seus personagens evaporaram-se com os eflúvios escoceses.

Depois de atravessar a Barão do Rio Branco também não encontro a Confeitaria Guairacá, nem a Schaffer, sua vizinha. Assim como do outro lado da rua desapareceu a livraria Ghignone e o velho Dude, lenda daqueles tempos já exauridos. Tento a Confeitaria Avenida, a Caiobá, e nada. Desço a Conselheiro Laurindo: no Bar do Juarez, nem sinal.

Em lugar nenhum sabe-se do grande Nireu Teixeira, que tanta falta faz à nostalgia de que sou possuído. Essa desmemorialidade coletiva é de enlouquecer: como assim, esqueceram dele e de seus companheiros de noitadas? Osiris, Sérgio Mercer, Luiz Fernando Arzua, Marcel, Caio? Imperdoável.

Nireu foi homem de múltiplos talentos. Alinhava o diploma de bacharel em Direito à competência como jornalista, que o levou a dirigir a redação do Correio do Paraná e do Correio de Notícias.

Era mestre em afinações de conversa, especialidade que exercitava no dia a dia como chefe de gabinete do prefeito Jaime Lerner ou da assessoria do governador, durante os dois mandatos de Lerner no Palácio Iguaçu.

Mas era nas mesas de bar que Nireu demonstrava atributos invejáveis. As tiradas traziam a verve característica:

– Precisamos trocar de bar ou de garçom, porque aos pedidos vem invertidos: a cerveja está quente e o torresmo frio.
– Ignorância é saber coisas demais.
– Ontem bebemos meia Escócia e um terço da Irlanda.
– O bairro das Mercês é muito aristocrático: aqui os galos só cantam às 11h da manhã.
– Minha terra cabe toda dentro de mim; ela é do tamanho da minha infância.
– Chegamos em casa semi-embriagadíssimos.

Quando sacava uma caixinha de fósforos do bolso, deslumbrava a plateia no acompanhamento de qualquer samba que alguém cantasse. Era um show. Nireu foi o único instrumentista de caixinha de fósforos a merecer um disco como solista.

Fui encontrá-lo na Praça Garibaldi sentado em seu banco, junto à árvore, local em que muitas vezes tocou caixinha com o grupo de chorinho que ali se apresentava aos domingos. Repetiu todos os seus jargões, perguntou pela minha família, confessou sentir saudade dos velhos tempos. Dali, ele (e Ninon, claro) seguem olhando os quatro filhos, neto, genro e amigos que ainda respiram por aqui.

Agradeci a gentileza, Nireu sempre foi generoso. Mas o planeta Curitiba sente muito a sua falta.

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