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GERSON GUELLMANN CABECA hojesc

O almoço de Dª Ruth Cardoso e o camarão que Jaime Lerner não engoliu

Não há carreira política que escape de um tropeço aqui e outro acolá — e isso vale para o Brasil e para o mundo. Desde sempre, os políticos contribuem com gafes que, quando cometidas em público, fazem seus assessores suarem frio e as plateias rirem — se não abertamente, ao menos por dentro.

Aqui no Brasil, entre gafes autênticas e boutades cuidadosamente improvisadas, a política nos brinda com momentos saborosos desde quando os registros eram feitos apenas por escrito. Mais tarde, com o advento do rádio e da televisão, o acervo de pataquadas aumentou exponencialmente. E agora, com as transmissões ao vivo e as mídias digitais, assistimos a verdadeiros programas cômicos — graças, em grande parte, ao despreparo de nossos representantes.

Conheci por dentro a máquina pública e posso garantir: se a realidade às vezes é mais divertida do que a ficção, também existem situações constrangedoras. Uma delas presenciei de perto, quando exercia a função de Chefe de Gabinete do Governador Jaime Lerner.

Em 1995 ou 1996 — não estou certo do ano — a primeira-dama do país, Dª Ruth Cardoso, esteve no Paraná para tratar da implementação do Programa Comunidade Solidária, criado por ela. Não há como negar que esse programa foi precursor, e mesmo inspirador, para as políticas sociais que viriam mais tarde — especialmente o programa Fome Zero, voltado à erradicação da miséria alimentar.

Nos compromissos da agenda montada pela querida e inesquecível Fani Lerner, foi oferecido à comitiva um almoço no Palácio Iguaçu, sede do governo estadual. O ambiente era elegante, a decoração impecável — tudo como manda o protocolo. Mas aí, ao se iniciarem os pratos, aconteceu o impensável: no serviço à francesa, apareceram vistosos e graúdos camarões, servidos com abundância.

A Fani, com a percepção apurada e a sensibilidade que tinha, certamente comentou com o Jaime, que lançou um olhar fulminante ao Chefe do Cerimonial. Os que eram “da casa” perceberam na hora: ele estava visivelmente incomodado. Aquilo era uma contradição gritante — servir um prato sofisticado como camarão justamente em um evento cujo tema, se não era diretamente o combate à fome, também passava por ele. Sem nenhuma intenção de fazer pilhéria, foi de péssimo gosto, para dizer o mínimo.

Um erro do cerimonial, sem dúvida — mas que não passou despercebido pela Fani e pelo Jaime. Nem, imagino, por Dª Ruth, mulher elegante demais para comentar, mas, com certeza, sensível à ironia do momento.

Se a política, como se sabe, é o palco das vaidades, as gafes são os tropeços que alguns atores dão quando estão entrando no palco. Algumas causam danos irreversíveis; outras viram anedotas de almanaque. Mas todas acabam revelando uma verdade: até os mais poderosos têm seus dias de “camarão no Fome Zero”.

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