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A mágica de parar o tempo em movimento

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Na essência da fotografia reside uma das maiores ousadias humanas: a tentativa de capturar o tempo em sua fuga constante. A câmera, como um pincel que desenha luz e sombra, realiza a mágica de parar o tempo em movimento. Walter Benjamin, em seu ensaio “A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica” (1935), nos fala da “aura” da obra de arte, algo que a fotografia reinterpreta ao congelar um instante que, na vida real, se esvai sem retorno. Benjamin ressalta que a fotografia permite “que o momento não só seja repetido, mas também eternizado”.

A fotografia de capa é uma obra de Carlos Henrique Wassmansdorf, capturando a essência de “uma viagem dos anos 80 que se tornou inesquecível. Era noite, e a jornada que nos levou de Curitiba a Florianópolis, em um fusquinha teimoso que mais parava do que andava, transformou-se em uma grande aventura. A bordo estavam eu, minha então namorada (hoje minha esposa), meu primo, uma amiga e um amigo, todos rumo à casa de descanso na Lagoa da Conceição, propriedade do meu tio e do meu pai. Durante a tarde de domingo, enquanto nos divertimos nas dunas da lagoa, decidimos registrar aquele momento especial. Com minha Yashica em mãos — cujo modelo específico já se perdeu na memória — expliquei ao meu primo alguns truques para capturar uma foto única, exatamente no momento em que eu estivesse no ar. E assim, conseguimos imortalizar essa arte espetacular”, relata Wassmansdorf.

É como se, ao pressionar o obturador, estivéssemos sussurrando ao tempo: “Fique um pouco mais!”. Essa mágica de imortalizar o efêmero é um ato poético que transcende a mera técnica. Roland Barthes, em “A câmara clara”, reflete sobre a fotografia como uma espécie de “certidão de presença”. Para ele, ao parar o tempo, a fotografia testemunha o “isso foi”, ancorado para sempre no momento em que o clique ocorreu, seja um sorriso, um gesto ou o vento que levanta a poeira na estrada.

O movimento, por sua natureza, é fluido e intangível. Heráclito já dizia que “ninguém se banha duas vezes no mesmo rio”, pois as águas, assim como o tempo, estão sempre em movimento. A fotografia desafia essa filosofia ao capturar o rio em seu curso, o sorriso em sua curva, o salto em seu ápice. E, nessa captura, há algo de místico, como se o fotógrafo domasse o próprio tempo.

Susan Sontag, em “Sobre fotografia”, nos lembra que a fotografia não só captura um momento, mas também o transforma, conferindo-lhe novos significados. Ao parar o tempo em movimento, não estamos apenas documentando a realidade, mas criando uma nova narrativa visual. Sontag afirma que “fotografar é conferir importância”. Cada foto, então, torna-se uma história contada em um único frame, um poema visual onde o movimento encontra a eternidade.

Na prática fotográfica, parar o tempo em movimento não é só uma questão técnica de velocidade de obturação ou enquadramento. É, acima de tudo, uma questão de olhar. Um olhar que percebe a dança dos momentos fugazes, que vê na fluidez do tempo uma oportunidade de revelar a beleza escondida no instante. Como Henri Cartier-Bresson, mestre do “momento decisivo”, afirmava, a fotografia é “o reconhecimento simultâneo, numa fração de segundo, de um evento e da organização precisa das formas que lhe dão significado”.

Assim, ao fotografar, ao parar o tempo em movimento, estamos não apenas congelando um instante, mas convidando o espectador a contemplar a dança da vida que ali se desenrolou. Cada imagem é um testemunho da passagem do tempo, um relicário que guarda o pulsar do momento, um feitiço que prende o movimento em um espaço-tempo particular. A fotografia, portanto, não é apenas uma arte visual; é uma arte temporal, uma celebração do instante fugaz que, ao ser capturado, se torna eterno.