Esta semana, vi em algum lugar da internet, que no Reino Unido está se pensando em diminuir o uso dos brinquedos modernos para as crianças. Na matéria, colocaram algumas imagens de crianças na cozinha, preparando alimentos, entre outras atividades interessantes e passíveis de substituir o tempo despendido com tais brinquedos, quando a criança fica quase passiva numa atividade que é, praticamente, só apertar alguns botões.
Em uma outra oportunidade, observei um grupo de crianças reunidas em torno de um brinquedo, que tinha uns” loopings” de plástico colorido, em que as crianças apertavam uma peça que impulsionava carrinhos que, por sua vez, deveriam seguir pela pista e dar todas as voltas sem sair da pista. Depois de um tempo, percebi que, além do tédio da repetição, as peças da estrada eram muito frágeis e, em pouco tempo, o brinquedo não mais existiria, por ter se quebrado. Então, imagino que seria necessário adquirir um outro brinquedo: o próximo “da moda”.
Em meu primeiro ano como professora da disciplina de Materiais e Equipamentos de Escultura, do curso de Escultura da Escola de Belas Artes, como tinha ganho da maestrina Hildegard Sobol Martins uma cópia de um livro alemão (em alemão) de brinquedos a serem feitos de madeira, pedi aos alunos que escolhessem, cada um, um brinquedo para fazer. Inicialmente, acharam meio infantil e reclamaram um pouco. Mas ao término do trabalho, ficaram muito entusiasmados com o resultado do que haviam produzido. Ficaram, realmente, muito bonitos os brinquedos – foi uma experiência interessante!
Os leitores da minha geração vão se lembrar de que não tínhamos brinquedos de plástico (quando muito, de metal) e estes, em geral, importados. As brincadeiras eram com pião de madeira, em que era necessário desenvolver a técnica de enrolar o barbante para fazê-lo girar no chão, ou em outras superfícies. As bolinas de gude, sempre muito disputadas, reuniam os meninos da rua em longas partidas, onde se ganhava, ou se perdia, os valiosos “olhinho” ou “bolão”, as lindas bolinas de vidro. Construir carrinhos com o que se achava pela casa, como tampinhas de garrafa para fazer as rodas, ou latas cortadas, bem como outros brinquedos que eram produzidos com os carretéis de linha de madeira que as mães usavam para costurar. Pipas, bonecas de pano, fogãozinho de metal com panelinhas, para fazer comidinhas de folhas, telefone com fio feito de latas e barbante, entre tantos outros que era possível inventar.
Nas artes, muitas vezes, fala-se da vida e do dia-a-dia das pessoas e, nesse interesse pelo cotidiano, alguns artistas tratam desse assunto – os brinquedos – vivido em sua própria infância ou em suas comunidades. Assim fazia Portinari, em suas obras, falando da vida no interior do Brasil ou, também, Mestre Molina, que cria em seu artesanato a representação das coisas que encantam e fascinam as crianças. Já Palatnik criou seus animais de acrílico e os objetos em movimento que, embora não fossem brinquedos, nos remetem a brinquedos animados, o sonho de qualquer criança. Por sua vez, Luiz de Souza, em suas pinturas surrealistas, com personagens encantados que brincam com o impossível, nos leva, por meio da própria linguagem, a lugares de sonhos onde ainda se pode brincar.
A brincadeira e a arte estão muito próximas, tanto pelo ato de inventar e criar o inédito quanto nos meios tecnológicos virtuais de hoje, quando a arte e a tecnologia se misturam para proporcionar surpresas e impressões fantásticas nas pessoas.
De tudo isso, acredito que o mais importante seja proporcionar espaço para a criação pessoal, para a surpresa, para a conquista que vem com o resultado de uma busca, seja ela na invenção de um brinquedo, ou em uma brincadeira, ou no desenvolvimento e aperfeiçoamento da técnica que permite ganhar uma partida de bola, de pique-esconde, de pular corda, ou de pingue-pongue.
[Ilustração de abertura: Obra (detalhe) de mestre Molina – (1917-1998). Acervo SESC de Arte. Av. Paulista.]
Leia outras colunas da Elizabeth Titton aqui.