A Câmara dos Deputados aprovou, nesta terça-feira (16), a proposta de emenda à Constituição que ganhou o nome de PEC da Blindagem por dificultar a responsabilização de parlamentares. O texto exige autorização prévia do Congresso para que o Supremo Tribunal Federal (STF) processe criminalmente deputados e senadores.
A PEC ainda previa que Câmara ou Senado Federal poderiam barrar esses processos em votação secreta. A votação secreta também se estende ao aval de uma das Casas no caso da prisão de um congressista. Um destaque proposto pelo Novo garantiu a derrubada desse trecho.
Apesar da supressão aprovada em rodada de votação depois de meia-noite, no primeiro turno, foram 353 votos sim e 134 não para aprovar o texto base da PEC. Eram necessários 308 votos para aprovação. A maioria da oposição votou a favor da proposta. O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva liberou sua bancada para votar como quiser e no PT 12 deputados apoiaram a PEC. No segundo turno de votação, foram 344 votos sim e 133 não, sendo que dois deputados petistas que haviam apoiado a proposta mudaram de posição.
A Constituição diz que parlamentares só podem ser presos em caso de crime inafiançável. São crimes inafiançáveis no Brasil racismo, tortura, tráfico ilícito de entorpecentes, terrorismo, crimes hediondos (homicídio qualificado, latrocínio, extorsão mediante sequestro, estupro, estupro de vulnerável, feminicídio e epidemia com resultado morte), e a ação de grupos armados contra a ordem constitucional.
O líder do PL, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ) celebrou o resultado da votação e disse que os parlamentares não poderiam continuar sob ameaças de ministros do STF. Ele protestou contra despacho de Alexandre de Moraes que pediu manifestação do Ministério Público sobre investigação que atinge o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. “Ele quer intimidar o governador”, protestou Sóstenes.
A PEC foi para votação após uma troca na relatoria. O anterior relator, Lafayette de Andrada (Republicanos-MG), era contrário a algumas das propostas apresentadas pelo Centrão. No lugar entrou Cláudio Cajado (PP-BA), que disse que o texto é “simples e conciso” e sem “licença para abusos”.
A Câmara ensaiou votar essa proposta ao longo do mês de março. Depois do motim de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que interrompeu os trabalhos no plenário da Casa, oposicionistas se reuniram com lideranças do Centrão para estabelecer um acordo de votação da anistia e do fim do foro privilegiado – caciques Centrão também apresentaram apoio à PEC da Blindagem.
Bolsonaristas sinalizam que, como parte do acordo para votar a PEC nesta terça-feira, a Câmara terá de colocar na pauta a anistia aos envolvidos no 8 de Janeiro.
A PEC da Blindagem tem amplo apoio do Centrão, e bolsonaristas manifestaram endosso crítico.
“O que nós queríamos com esse resgate das nossas prerrogativas é que o Parlamento fosse respeitado e que fosse colocado na PEC que nossas palavras e opiniões, em qualquer meio, não podem ser violados. É um texto muito aquém. Mas pelo menos já nos garante minimamente as nossas prerrogativas”, afirmou Bia Kicis (PL-DF).
Já Zé Trovão mencionou que é contrário a pontos da PEC, como o voto secreto, mas entende que aprovar essa proposição nesta terça-feira é o aval que precisa para se cumprir o acordo e votar a urgência (aceleração da tramitação) da anistia aos envolvidos nos atos golpistas de 8 de Janeiro.
“O que está sendo votado hoje está sendo votado para amanhã ser votada a anistia. Eu não concordo com o que está sendo votado agora. Voto secreto jamais eu vou aceitar. Agora, fica o recado que amanhã esta Casa vote a anistia”, afirmou.
O governo é contra a PEC. “Respeitar cada instituição é fazermos a pauta que interessa ao Brasil. Ao Brasil não interessa a anistia, ao Brasil interessa modificar a legislação sobre o Imposto de Renda”, disse Maria do Rosário (PT-RS).
Antes da votação, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), disse, sem mencionar o STF, que a PEC é efeito de uma reação a “abusos” cometidos contra colegas.
“Diante de muitas discussões, de atropelos, de abusos que aconteceram contra colegas nossos em várias oportunidades, a Câmara tem hoje a oportunidade tem hoje a oportunidade de dizer se quer retomar esse texto constitucional ou não”, disse.
Caso aprovada pelo Congresso Nacional, a expectativa é que a PEC da Blindagem novamente imponha uma barreira para o STF julgar deputados e senadores.
A licença prévia era um mecanismo disposto na Constituição de 1988, posteriormente retirada após a aprovação de uma PEC em 2001, após pressão popular.
O Estadão mostrou em agosto que Câmara e Senado barraram pelo menos 224 pedidos de licença prévia feitos pelo STF para processar criminalmente congressistas até 2001, ano em que mudou a regra para dispensar a consulta ao Legislativo. Nenhum pedido da Corte avançou.
Desses episódios, a reportagem identificou 15 pedidos derrubados na Câmara e nove no Senado.
Segundo Cajado, o relator, a mudança de 2001 acabou “por inferiorizar a posição institucional das Casas Legislativas e por fragilizar o exercício do mandato eletivo”.
“Concluímos ser necessário, nesse momento, voltar a garantir aos congressistas, no exercício do mandato e em função dele, plena liberdade, como forma de preservar o Poder Legislativo e os princípios da separação dos Poderes e da soberania popular e, portanto, a própria democracia”, afirmou Cajado.
Ainda, segundo ele, só será possível o pleno exercício das atividades parlamentares “se o Congresso Nacional estiver munido das devidas prerrogativas”.
Veja como votaram os deputados catarinenses no 1° turno
Ana Paula Lima (PT) – votou contra
Caroline de Toni (PL) – votou a favor
Cobalchini (MDB) – votou a favor
Daniel Freitas (PL) – votou a favor
Daniela Reinehr (PL) – votou a favor
Fabio Schiochet (União Brasil) – votou a favor
Geovania de Sá (PSDB) – votou a favor
Gilson Marques (Novo) – votou contra
Ismael (PSD) – votou a favor
Jorge Goetten (Republicanos) – votou a favor
Julia Zanatta (PL) – votou a favor
Luiz Fernando Vampiro (MDB) – votou a favor
Pedro Uczai (PT) – votou contra
Pezenti (MDB) – votou a favor
Ricardo Guidi (PL) – votou a favor
Zé Trovão (PL) – votou a favor
Veja como votaram os deputados catarinenses no 2° turno
Ana Paula Lima (PT) – votou contra
Caroline de Toni (PL) – votou a favor
Cobalchini (MDB) – votou a favor
Daniel Freitas (PL) – votou a favor
Daniela Reinehr (PL) – votou a favor
Fabio Schiochet (União Brasil) – votou a favor
Geovania de Sá (PSDB) – votou a favor
Gilson Marques (Novo) – votou contra
Ismael (PSD) – votou a favor
Jorge Goetten (Republicanos) – votou a favor
Julia Zanatta (PL) – votou a favor
Luiz Fernando Vampiro (MDB) – votou a favor
Pedro Uczai (PT) – votou contra
Pezenti (MDB) – votou a favor
Ricardo Guidi (PL) – votou a favor
Zé Trovão (PL) – votou a favor
Como vai funcionar a PEC da Blindagem
A PEC da Blindagem (PEC 3/2021) é uma Proposta de Emenda à Constituição aprovada na Câmara dos Deputados e agora em tramitação no Senado, que altera regras relativas a processos criminais, prisões e investigações envolvendo parlamentares — deputados e senadores.
Principais pontos da PEC da Blindagem
Autorização prévia da Casa Legislativa
Para que um parlamentar possa ser processado criminalmente ou preso (fora de flagrante de crime inafiançável), será necessária uma licença prévia da respectiva Casa (Câmara ou Senado).
Votação secreta
Essa autorização deverá ocorrer por votação secreta na Casa a que o parlamentar pertence.
Prazo de até 90 dias
Quando houver solicitação de abertura de ação penal ou pedido de prisão, a Casa terá um prazo de até 90 dias para deliberar sobre a autorização. Se a Casa não decidir dentro desse prazo, a ação penal será iniciada automaticamente.
Foro especial para presidentes de partidos
A PEC estende o direito ao foro por prerrogativa de função também para presidentes de partidos com representação parlamentar, ou seja, esses dirigentes seriam julgados no Supremo Tribunal Federal (STF) e não por instâncias inferiores.
Prisão em flagrante
A proposta prevê que parlamentares não poderão ser presos, exceto em flagrante de crime inafiançável. Mesmo nesses casos excepcionais, será exigida manifestação da Casa (Câmara ou Senado), por votação secreta, em até 24 horas. A Casa poderá suspender a prisão se aprovar, por maioria simples, sua suspensão.
Manutenção de algumas regras atuais
Não será mais exigido aval do Congresso para abertura de investigações criminais — ou seja, o STF continua podendo autorizar inquéritos contra parlamentares sem autorização do Legislativo.
A exigência de maioria simples do STF para condenações permanece inalterada — não há exigência de maioria qualificada no Supremo para esse fim na versão aprovada.
Foto: Kayo Magalhães/Câmara dos Deputados
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